segunda-feira, 13 de abril de 2020

Carta dos Trabalhadores/as de Suzano

CARTA ABERTA DE TRABALHADORAS E TRABALHADORES SOCIAIS DE SUZANO EM DEFESA DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO DIREITO DA POPULAÇÃO E DEVER DO PODER PÚBLICO

Prezados e prezadas gestores da assistência social e autoridades públicas municipais,

O Brasil vive um momento marcado por medo e incertezas em virtude da doença
respiratória causada pelo Covid-19, declarada em caráter de pandemia pela Organização Mundial
da Saúde e em situação de calamidade pública e emergência por todas as esferas de governo do
Brasil, inclusive em Suzano. Diante disso, temos recebido diversas determinações e orientações
buscando retardar a disseminação do vírus, reunindo esforços de governos, sociedade civil, das
empresas e de cada cidadão e cada comunidade.

Entretanto, ao analisarmos a conjuntura brasileira, percebemos que grande parte da
população não dispõe de condições que possibilite seguir tais orientações, uma vez que o Brasil é
marcado pela desigualdade social, em que poucos gozam de condições privilegiadas, e muitos
vivem com a dúvida de como irão garantir a alimentação no dia seguinte, ou como irão seguir a
orientação de isolamento social morando em um cômodo com familiares.

Nesta condição, a implementação de políticas públicas é de extrema importância para
garantir a proteção social e uma vida digna a toda a população do Brasil. Contudo, é sabido que o
Brasil vivencia cenário de redução e desconstrução de tais políticas. Inclusive, a Política de
Assistência Social nos últimos anos vem tendo sucessivas reduções ou remanejamento dos recursos
para atender aos interesses de um estado neoliberal, que aprofundou o a crise com a Emenda
Constitucional 95 (PEC do Teto de gastos públicos), reduzindo e precarizando os serviços públicos,
propagando o retorno da miséria em cada canto do país, realidade que incide sobre Suzano
também.

No entanto, diante da pandemia declarada pela Organização Mundial de Saúde e da
calamidade pública de saúde no Brasil e em Suzano, é urgente reforçar e criar estratégias para o
fortalecimento das políticas públicas para atender as necessidades de proteção social da população,
sobretudo da população pobre e mais vulnerável que, sem dúvida, é a que mais sofre diante de um
estado de recessão, para garantir o direito constitucional de assistência social enquanto “os
mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da
sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas” (LOAS, art. 1o).

Nesse sentido, a atuação da Política de Assistência Social é essencial diante das situações de
vulnerabilidade social, buscando garantir proteção social, e minimizando os danos em meio a este
momento de medo, pânico e incertezas. Por isso, e considerando a situação de calamidade pública
declarada pelo Estado e a situação de emergência em Suzano, nós, trabalhadores do Sistema Único
de Assistência Social – SUAS, solicitamos ao órgão gestor e as autoridades públicas competentes:

 a elaboração de um plano emergencial, de forma colegiada com trabalhadores em consonância
com as premissas e objetivos da política de assistência social, com as estratégias de trabalho
social a serem adotadas em contingência para reduzir a circulação de pessoas no serviço e
garantir o acesso ao direito de assistência social a quem dele necessitar nesta, evitando assim a
propagação do vírus;

 providências imediatas e necessárias para garantir as condições adequadas de trabalho para o
cumprimento das tarefas em nossas diversas funções, conforme orientação dos órgãos
competentes em saúde pública, pois somente dessa forma conseguiremos nos proteger e
garantir a proteção dos usuários atendidos.

Mediante a situação de uma possível calamidade pública vivenciada em nosso município,
causada pela pandemia originária do CORONA VÍRUS, os trabalhadores e as trabalhadoras do SUAS do Município de Suzano vem afirmar nosso comprometimento ético-político com a política pública de assistência social e solicita que a gestão municipal leve em consideração os servidores hoje atuantes na Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social, que diariamente, dedica-se
pessoal, profissional e humanisticamente sem se eximir ao enfrentamento de diversas outras
calamidades públicas que geram agravos sociais a nossa população em situação de
vulnerabilidades.

Nós, trabalhadores e as trabalhadoras (assistentes sociais, psicólogos, educadores sociais,
administrativos, auxiliares de serviços gerais, motoristas, pessoal da Frente de Trabalho e afins),
que sempre demonstraram seu comprometimento, estando nas operações de chuva, nas
abordagens de rua, realizando visitas domiciliares em territórios de alta periculosidade, pois
entendemos que temos um compromisso ético com a população a qual nos propomos a proteger
(no que tange às seguranças afiançadas na Proteção Social), reivindicamos uma reflexão sobre o
que vem sendo deliberado para a Pasta e as estruturas fornecidas para o enfrentamento da
Pandemia viral.

Frente à situação atípica e na escala desta PANDEMIA, a garantia do funcionamento dos
serviços da assistência social em condições adequadas como essenciais estratégica e legalmente é
uma responsabilidade de gestores públicos, que arriscam as medidas de responsabilização em caso
de não cumprimento de suas atribuições, possivelmente expondo a riscos trabalhadores sociais na
linha de frente do enfrentamento da pandemia, sem procedimentos organizados e em condições
adequadas para t anto, o que leva ao próprio comprometimento da continuidade do atendimento
em estruturas inadequadas para o acolhimento das demandas cotidianas de forma segura. Os
servidores e os serviços da Assistência Social não têm estruturas técnicas e instrumentais sobre
epidemias e pandemias, nem estrutura física adequada para lidar com o que está posto. A realidade
atual é que precisamos do básico para enfrentar o que estar por vir.

Compartilhamos também, a bem de contribuir para as medidas solicitadas ao órgão gestor
da assistência social e às autoridades públicas do município, um conjunto inicial de propostas
técnicas, de gestão, normativas e de mobilização:

1. Seguranças que devem ser adotadas para a redução da transmissibilidade do covid – 19:

a) fornecimento de equipamentos de Proteção Individual que forem necessários para os
procedimentos a serem cumpridos;
b) definição de atendimentos a serem mantidos e procedimentos de trabalho seguros contra a
transmissão;
c) definição de leiaute adequado e seguro para a execução das atividades;
d) suporte emocional a trabalhadores sociais ao longo da sustentação das medidas de contingência
adotadas para os atendimentos;
e) certificação da autoridade sanitária municipal sobre o cumprimento das medidas profiláticas
determinadas pelo poder público municipal, em consonância com o governo estadual e o governo
federal, em relação aos serviços socioassistenciais e seu órgão gestor;
f) providenciar vacinação dos servidores, que, apensar de atender a mesma população vulnerável
que a política pública de saúde, historicamente não são contemplados como prioridade nas
campanhas de vacinação.
g) articulação com a SMS em cumprimento à orientação da Seds, para que as equipes do SUAS
recebam treinamento da equipe de saúde para nossa atuação segura.

2. Definição de critérios para reorganização do cumprimento das alterações decretadas para
a atividade de servidores públicos e outros trabalhadores na SMADS enquanto responsável pelos
serviços essenciais de assistência social:
a) quais unidades, quais serviços e quais procedimentos deverão ser mantidos em funcionamento,
a modalidade, o horário e a respectiva rotina de coordenação e supervisão;
b) adoção e detalhamento do procedimento para o afastamento de servidores sob suspeita de ter
contraído o covid – 19 (sintomáticos e egressos de áreas de viagem internacional), em grupos de
risco e para isolamento de quem manteve contato com pessoas infectadas para teletrabalho, bem
como quais tarefas a cumprir, jornada de referência e meio de comprovação posterior;
c) certificação de que os responsáveis por bolsistas da Frente de Trabalho, trabalhadores
terceirados, estagiários e eventuais outros profissionais que permaneçam atuando na SMADS neste
período de contingência recebam a orientação e suporte de seus supervisores, responsáveis e
contrates no cumprimento das medidas de enfrentamento da epidemia do covid-19;
d) caso o contingente de profissionais à disposição dos serviços mantidos na SMADS não seja
suficiente ou venha a ser reduzido em decorrência de novos afastamentos, realizar a contratação
temporária de profissionais competentes para as respectivas funções;
e) resolução de casos omissos de servidores impedidos de exercer as funções em decorrência da
suspensão de funcionamento de escolas, creches, transporte público, cuidados de familiares
dependentes;
f) atenção e cumprimento das normas de profissões regulamentadas, bem como às diretrizes éticas
da NOB-RH Suas para trabalhadores sociais.

3. Providências de cumprimento da diretriz de participação social na assistência social:
a) instalação imediata de um comitê de gestão colegiada com participação de gestores,
trabalhadores sociais, conselho municipal e outros atores da política de assistência social para
acompanhar, aconselhar e opinar periodicamente sobre as atividades socioassistenciais realizadas
em contingência e sua resolutividade;
b) participar propositiva e efetivamente do debate nacional e estadual acerca da sustentação do
SUAS, do SUS e outras políticas essenciais na estratégia de enfrentamento do covid-19;
c) participar urgentemente da discussão nacional e local, a partir da realidade de Suzano, sobre as
garantias de renda e outros direitos de seguridade para a população afetada economicamente
pelas necessárias medidas de enfrentamento da epidemia do covid-19 (voucher para autônomos,
renda básica de cidadania, acréscimo no PBF etc.);
d) elaborar e apresentar para consulta e aprovação do Comas o plano de contingência da
assistência social na estratégia de enfrentamento à covid-19.

4. Regulamentação e transparência das decisões e planos de ação:
a) publicação em ato oficial no DOEM as decisões sobre o funcionamento dos serviços e a
organização de servidores;
b) comunicar pelos meios oficiais adotados na contingência os órgãos de direito, de justiça e de
outras secretarias municipais;
c) criar fluxo de registro e encaminhamento de denúncias de violações de direitos e violências neste
período da vigência da calamidade com os órgãos da Prefeitura e dos sistemas de justiça e de
direitos.
d) garantir a democratização e a viabilização das informações e orientações necessárias à
população no que diz respeito ao acesso aos programas, serviços e benefícios sociais disponíveis
nesse momento de pandemia do Covid-19.
e) criar estratégias e contribuir na criação de fluxos e procedimentos que facilitem o atendimento
de serviços, programas, projetos benefícios e transferências de renda.
d) aproveitar e utilizar os dados do Cadastro do Único para melhoria e a criação de ofertas
socioassistenciais para atender de modo mais eficiente e com indicadores objetivos e científicos de
resultado frente as atuais e novas demandas da população em vulnerabilidade social que podem
ser agravadas pela falta cobertura das seguranças afiançadas pela Política de Assistência Social e
outras Políticas Públicas.

É importante considerar que antes de propagarmos ações pelo município, precisamos
pensar nas de nível básico, de proteção e cuidados mínimos aos nossos usuários(as), bem como,
aos trabalhadores, os quais, também são cidadãos e cidadãs que merecem respeito, atenção e
cuidado. Os servidores (as) na pasta, também tem suas famílias, que podem ser potenciais
transmissores e receptores territoriais. Vamos ter responsabilidade com os nossos também.

Esta reflexão visa uma atitude responsável para com as equipes que sempre estiveram e
continuarão à disposição em todo tempo e em todos os momentos, desde que, não colocada em
risco. A Assistência Social é uma área importante e fundamental em situações de agravos sociais,
estando presente proativamente ou sendo sua presença solicitada nas mais diversas circunstâncias
emergenciais deste município, ainda que de forma cada vez mais degradada, descaracterizada e
distante do que prevê a Política de Assistência Social nos últimos tempos. Para que possamos
proporcionar proteção social adequada às pessoas idosas, às pessoas em situação de rua e aos
demais usuários desta política, sugerimos uma escuta adequada junto aos profissionais da ponta e
do órgão gestor nas tomadas de decisões. Estamos solicitando atenção aos princípios básicos da
Política Pública de Assistência Social, descentralização e participação coletiva para juntos
buscarmos caminhos efetivos e assertivos, que sejam possíveis e viáveis para o momento, sem
colocar em risco a população, os trabalhadores e seus familiares.

Esse é o nosso papel e o nosso dever com a garantia de direito de proteção social.

Atenciosa e preocupadamente,

Trabalhadores e Trabalhadoras do SUAS do Município de Suzano

25 de março de 2020 – Suzano – SP

Referências:
BURGOS, Fernando; MICHETTI, Miqueli. O Covid-19, as desigualdades brasileiras e a assistência social. Jornal O Estado de São Paulo,

blog Gestão, Políticas & Sociedade, 22 de março de 2020. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/gestao-politica-
e-sociedade/o-covid-19-as-desigualdades-brasileiras-e-a-assistencia-social/?

utm_source=estadao:whatsapp&utm_medium=link
DECRETO no 10.282, DE 20 DE MARÇO DE 2020. Regulamenta a Lei no 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, para definir os serviços
públicos e as atividades essenciais. Publicada no DOU, em 20/03/2020.
DECRETO no 9.432, de 16 de março de 2020. Dispõe sobre a adoção, no âmbito da Administração Pública direta e indireta do
Município de Suzano, de medidas temporárias e emergenciais de prevenção ao contágio pelo COVID-19 (Novo Coronavirus),
bem como sobre recomendações a serem observadas pelo setor privado, e dá outras providências.
DECRETO no 9.437, de 19 de março de 2020. Dá nova redação e acrescenta novos dispositivos ao Decreto Municipal no 9.432, de 16
de março de 2020, que dispôs sobre a adoção, no âmbito da Administração Pública direta e indireta do Município de Suzano, de
medidas temporárias e emergenciais de prevenção ao contágio pelo COVID-19 (Novo Coronavirus), bem como sobre
recomendações a serem observadas pelo setor privado, e dá outras providências.
DECRETO no 9.438, de 20 de março de 2020. Declara situação de emergência no Município de Suzano; define outras medidas para o
enfrentamento da pandemia decorrente do COVID-19 (Novo Coronavirus), e dá outras providências.
LEI No 13.979, DE 6 DE FEVEREIRO DE 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de
importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Publicada no DOU, em 07/02/2020.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Recomendação administrativa do Processo Administrativo de Acompanhamento
no 62.0451.000571/2020-9, de 20 de março de 2020.
NOTA PÚBLICA. Medidas de Prevenção ao Coronavírus nas Unidades de Acolhimento Institucional. MINISTÉRIO DA CIDADANIA e
MINISTÉRIO DA MULHER, FAMÍLIA E DIREITOS HUMANOS. (s/d)
PAIVA, Andrea Barreto de; MESQUITA, Ana Cleusa Serra; JACCOUD, Luciana; PASSOS; Luana. (Organizadoras). O Novo Regime Fiscal
e suas implicações para a política de Assistência Social no Brasil. Nota Técnica - 2016 - setembro - Número 27, IPEA.
RESOLUÇÃO CFESS No 273, de 13 março de 1993. Institui o Código de Ética Profissional do/a Assistente Social e dá outras
providências.
RESOLUÇÃO CFP no 010/2005, 21 de julho de 2005. Aprova o Código de Ética Profissional do Psicólogo.
RESOLUÇÃO No 269, de 13 de dezembro de 2006. DOU 26/12/2006. Aprova a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do
Sistema Único de Assistência Social – NOB-RH/SUAS.
RESOLUÇÃO SEDS - 7, DE 17-3-2020. Estabelece os procedimentos a serem adotados na prevenção de contágio pelo Coronavírus –
Covid 19. Publicada no DOE, em 18/03/2020.

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