Uma
reflexão para quem vivencia as respostas e acessos ao SUAS cidadãs e cidadãos
Vive-se
a soberania do Estado Fiscal que menospreza o Estado Social. Entende-se que
proteção social, nos ditames neoliberais, é responsabilidade de cada um e não
reponsabilidade coletiva e social. Não é aceito gasto social para além do
padrão esmolar. O gasto social com
proteção social é considerado desperdício de orçamento e presença de má fé e
fraude dos requerentes, mesmo sendo parte das garantias constitucionais de seguridade
social. O Estado Fiscal tem por fundamento concepção esmolar do benefício de proteção
social pública, não incorpora como dever de Estado o reconhecimento social de
cidadania e seus direitos . O Estado Fiscal não tem consciência da barbárie que
a desigualdade social- economica e política provoca na precarização da sobrevivência
de indivíduos e familias apesar de humano
A
ocorrência do encolhimento do Estado Social pós CF-88 em 2024 está marcada por dois
agravantes.
O
primeiro deles deriva do rompimento em 2016 com os ecos do pacto social de
reconhecimento universal da cidadania dos brasileiros que fora instalado pelo
Estado de Direito erigido pela Constituição Cidadã de 1988. Regrediu-se na
pactuação do Estado Social da sociedade
brasileira a partir de 2016 .Exemplo claro foi o do abandono do fortalecimento
de direitos e garantias de crianças e adolescentes( ECA 1990) substituídos pelo marketing do slogan: Criança Feliz.
Proteção social retrocedeu da condição de direito
de cidadania, sendo substituído pela precarização da seleção dos mais
miseráveis submetidos a prática seletiva
e meritocrática da benemerência. Impressiona quando o Estado Fiscal faz
retroceder o Estado Social, provocando o acanhamento da responsabilidade
pública tornando-se regulador do modo
com que tem que ocorrer relações de convivência, de laços familiares e suas
obrigações de sustento mútuo. Uma invasão que parece retornar aos costumes do
senhores de senzalas
Pós
2016 foi disseminado, a alta voz, o entendimento neoliberal de que a proteção
social é um dever pessoal e individual e de alçada da familia, e da
benemerência da sociedade. Voltou-se a Colonia e ao Império, deixou-se a
República. O cidadão de baixa renda foi despedido de seus direitos, fugindo o
Estado de sua responsabilidade social .
O Estado brasileiro sob nova investidura foi deixando
de ser Social no campo do direito, passando a exercer referência esmolar,
meritocrática ,seletiva e emergencial. Adotou no social a lógica da
miserabilidade e não mais, a do direito.
Como
uma segunda grande ocorrência, tem-se um descolamento dos propósitos cidadãos no Governo
da Coalizão salvacionista da barbárie, em defesa da democracia. Em 2023 foi fortemente
resgatada a centralidade do combate à fome e combate à pobreza. Essa mensagem
embora tenha a direção de dignidade para todos em sua sobrevivência, colocou ao
largo o acesso a direitos sociais e a garantia
do Estado Social aos direitos sociais. Combate à fome ou à miséria não pode
significar a imobilidade das conquistas sociais de proteção social . Mas
infelizmente esse deslocamento passou a ocorrer como se uma nova regra tivesse silenciosamente
banido conquistas sociais . O SUAS Sistema Único de Assistência Social virou
banalidade. A relação terceirizada passou a ter maior relevo para os interesses
de gestores com a manutenção da redução, iniciada pós 2016, do orçamento do SUAS no Governo Federal.
Em
nome da operação limpeza na gestão estatal de favorecimentos bolsonaristas, foi construída perversamente, pelo MDS o
entendimento de que os requerentes e usuários de beneficios monetários agiam de
má fé, praticavam fraudes. O discurso praticado deslizou do exercicio de revisão
da gestão bolsonarista para a acusação de que os requerentes e usuários de benefícios monetários seriam fraudadores
que precisavam receber uma investigação: verificar onde viviam, com quem
viviam, entrar em sua casa e fiscalizar. Tudo isso sem qualquer apoio de defesa
ou escuta dos beneficiários ou requerentes.
Manifestou-se total desrespeito aos cidadãos
de baixa renda, em manifesta síndrome escravagista e discriminadora daqueles sob
baixa renda. Autoridades recorreram a
metáforas escolásticas com nominação de operação cata-piolho, pente fino e que
tais.
Desenvolveu-se
na comunicação dos representantes oficiais estatais, sobretudo paradoxalmente do
MDS, a imagem de que a população beneficiária não era confiável mas nunca foi
indagado pela burocracia do MDS se os beneficiários tinham segurança alimentar
Do que e quando se alimentavam? Não importou a vida concreta se de miséria ou
fome, reproduzir na gestão da proteção social as palavras de ordem: combate à
fome e combate à miséria. Não se indagou o que não ocorria no processo de
gestão de beneficios que empesteava tudo de piolhos.
O processo de comunicação adotado pela SNAS não
reforçou o SUAS em suas
responsabilidades, suas unidades de referência, a qualidade de seu serviços. As
mensagens sobre o SUAS passaram a indicar que sua trajetória institucional seria
o acesso ao alimento, sem contudo ter qualquer introdução de novas condições ou
regulação para tanto, ou mesmo sem ter perspectiva de superar a precariedade de
presença de seus serviços nos municipios.
Não ocorreu a decodificação dessas metas em
ações concretas de combate à forme e miséria que tivessem o poder de se
tornar substitutos da garantia de direitos sociais, ou de proteção social a ser garantidas pelas política social em
âmbito federal e federativo.
Vive-se
o rompimento do pacto social da Constituição de 1988 e a destituição do
reconhecimento social pelo Estado brasileiro, em sua dimensão social, de afiançar
a condição de cidadão daqueles com menor renda. Pior, vem ocorrendo uma
destruição da dignidade de cidadãs e
cidadãos mesmo deficientes ou idoso. A comunicação verbal e institucional do
MDS apresenta os usuários de atenção da proteção social de assistência social como
praticantes de fraude contra o Estado. Embora essa acusação, eles não tem onde
nem como se defenderem da acusação burocrática.
A comunicação do MDS é omissa em sedimentar o
Estado Social pela solidariedade coletiva, pela garantia de direitos sociais .
Usa de concepção esmolar e não pratica o reconhecimento social estatal da cidadania
com os segmentos mais precarizados da sociedade.
A
gestão do SUAS, por sua vez ,não teve voz para se manifestar diante das
acusações do Estado Fiscal que disseminou na sociedade a figura de que o BPC é um
lugar de roubo do Estado, o que torna o SUAS um sistema que compactua com a
fraude e que não desperta todos para a construção da proteção
social estatal, disseminada pelo pacto Constituição de 88. Discute-se orçamento
em valores numéricos, desnudado de direitos e trato cidadão daqueles que tem
menos renda. Parece que se está tratando de algo irregular e moralmente indevido.
O
BPC foi desenhado ao público de modo a que adquirisse a forma e um artificio para
tirar de forma espúria, interessada individualmente o dinheiro do Estado. M\as
nada se discutiu sobre a gestão precária do BPC, nada se disse que os seus
usuários e requerentes não tem canal de escuta, que são açodados pela
inteligência artificial sem condição e
preparo para enfrentá-la. Nada se disse que o Fundo Nacional de Assistência Social-FNAS
é quem, no Orçamento Federal, detém recursos
para o BPC mas não o aplica pois o transfere para o INSS. Sim, o INSS é contratado pela
SNAS por significativo valor para gerir
o BPC mas nada é dito sobre isso.
Nada
se diz sobre a existência (ou não existência) de avaliação do serviço que é
prestado ao usuário pelo INSS. Nada se diz que dentre usuários idosos do BPC
boa parte foi contribuinte da previdência que recolheu seus contributos mas que
pelo fato dele não ter completado o tempo para a previdência formal, não lhe
foi permitido seguir o caminho
tradicional, embora suas contribuições financeiras tivessem permanecido no INSS.
Nada
foi dito que a renda mensal vitalícia criada em 1974, para atender aos
contribuintes que não completavam a quantidade de contribuições para se
aposentar, foi a antecessora do BPC e que ainda dentre beneficiários há
aproximadamente 40 mil deles procedente dessa ação governamental substituída na
prática em 1996 pelo BPC .
Em
quem momento, de toda essa operação fiscal de restrição ao BPC, foram ouvidos
os profissionais que atuam na atenção a beneficiários? Onde se encontra a
divulgação dos relatórios técnicos que embasaram as decisões restritivas ? Onde
foram ouvidos beneficiário?
Crescimento da presença de autismo, crescimento
da judicialização em um processo que nega atenção presencial do requerente, com
certeza o coloca na oferta de alguém que vai auxilia-lo, o advogado que o chama
erroneamente de “O LOAS”, reiterando o reducionismo da LOAS e do SUAS .
Há
um ditado bastante usado pelo Presidentes Lula. Como prova de um fato não adianta
mostrar só o pau, tem que mostrar o pau e a cobra. Parece que falaram de muitos
paus e restringiram a demonstração das cobras e suas espécies, múltiplas
espécies.
Profa .Dra. Aldaiza Sposati
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